segunda-feira, 28 de maio de 2012

Capítulo 54 - Jane e Sr. Bingley ficam noivos


Capítulo 54 - Jane e Sr. Bingley ficam noivos


Alguns dias após esta visita, o Sr. Bingley tornou a aparecer, mas só. O amigo partira naquela manhã para Londres, com a promessa de voltar dentro de dez dias. O Sr. Bingley demorou-se mais de uma hora e estava de excelente humor. A Sr.a Bennet convidou-o para jantar, mas, desculpando-se amavelmente, declarou já estar comprometido para essa tarde.

- Da próxima vez que nos visitar - disse a Sr.a Bennet - espero que tenhamos mais sorte.

Ele respondeu-lhe que teria imenso prazer em vir em qualquer outra ocasião, etc., etc.; e que, se ela lhe desse licença, voltaria muito em breve.

- Poderá vir amanhã?

Que sim, que não tinha compromissos para o dia seguinte, e o convite foi aceite com entusiasmo.


Ele veio, e tão pontualmente que as senhoras ainda não estavam prontas quando ele chegou. A Sr.a Bennet precipitou-se para o quarto das filhas, enrolada no seu roupão e o cabelo meio por pentear, exclamando:

- Minha querida Jane, despacha-te e corre lá abaixo. Ele chegou... o Sr. Bingley chegou. Ele já chegou. Vá, depressa! Sarah, vem ajudar a Menina Bennet a vestir-se. Deixa o cabelo da Menina Lizzy para depois.

- Nós desceremos logo que pudermos - disse Jane -; mas Kitty é mais despachada que nós e já desceu à meia hora.

- Oh, que interessa Kitty! Que tem ela a ver com isto!? Vá, despacha-te, despacha-te! Onde tens o teu lenço, minha querida?

Mas, quando a sua mãe as deixou, Jane recusou-se a descer sem uma das irmãs.

Durante a visita, a Sr.a Bennet mostrou a mesma ansiedade que de costume para deixar o Sr. Bingley e Jane a sós. Findo o chá, o Sr. Bennet retirou-se para a biblioteca, como sempre o fazia; e Mary subiu para praticar no piano. Dos cinco obstáculos, dois estavam suprimidos. A Sr.a Bennet pôs-se, então, a olhar fixamente e a fazer sinais na direcção de Kitty e Elizabeth, que pareciam determinadas a não dar por nada. Elizabeth fingiu que não via e Kitty, ingenuamente, disse:

- Que é, mãezinha? Por que me está a piscar os olhos dessa maneira? Que quer de mim?

- Nada, minha filha, nada. Não te pisquei os olhos. - Ela então permaneceu quieta durante mais cinco minutos; mas, incapaz de ver desperdiçada ocasião tão preciosa, levantou-se subitamente e, dizendo para Kitty: - Anda, meu amor, preciso de conversar contigo - levou-a da sala. Jane imediatamente lançou um olhar para Elizabeth, em que exprimia a sua contrariedade por tal manobra e lhe suplicava que, pelo menos ela, não se prestasse àquela comédia.
Poucos minutos depois, a Sr.a Bennet entreabriu a porta e chamou:

- Lizzy, minha querida, preciso de falar contigo. 

Elizabeth foi forçada a ir.

- É melhor deixá-los a sós, sabes - disse-lhe a mãe, assim que se encontrou no vestíbulo. - Kitty e eu vamos lá para cima, para o meu quarto de vestir.

Elizabeth decidiu não argumentar com a mãe; contudo, permaneceu tranquilamente no vestíbulo e, quando sua mãe e Kitty subiram, voltou para a sala.

As manobras da Sr.a Bennet para aquele dia resultaram infrutíferas. Bingley era o encanto personificado, mas não o professado apaixonado de sua filha. O seu à-vontade e boa disposição tornavam-no no mais agradável dos companheiros e ele suportava as inadequadas delicadezas com que o cumulava a Sr.a Bennet e escutava as suas tolas observações com uma paciência e seriedade pelas quais a filha se sentia intimamente reconhecida.

Ele quase não precisou de convite para ficar para jantar; e, antes de se ir embora, foi-lhe feito um convite, que não só se deveu à intervenção da Sr.a Bennet como também fora provocado por ele próprio, de voltar na manhã seguinte para caçar com o Sr. Bennet.

A partir daquele dia, Jane não tornou a falar na sua indiferença. Nem uma palavra foi trocada entre as irmãs acerca de Bingley; mas Elizabeth foi para a cama contente, com a certeza de que tudo chegaria em breve a uma conclusão feliz, a menos que o Sr. Darcy voltasse antes da data prometida. Contudo, ela estava de certo modo persuadida de que tudo aquilo acontecia com a aquiescência dele.

No dia seguinte, Bingley chegou pontualmente; e o Sr. Bennet e ele passaram a manhã juntos, conforme haviam combinado. O Sr. Bennet encontrou nele um companheiro muito mais agradável do que esperava; não encontrava em Bingley nenhuma pretensão que o tornasse ridículo, nem insensatez que o obrigasse a ele a refugiar-se irritadamente no seu silêncio. Quanto ao Sr. Bingley, nunca o achara mais comunicativo e menos excêntrico do que naquele dia. Bingley, naturalmente, voltou com ele para jantar, e, à noite, a Sr.a Bennet lançou mão de todos os recursos para deixá-lo a sós com a filha. Elizabeth, que tinha uma carta para escrever, retirou-se logo após o chá; pois, uma vez que todos eles iam jogar às cartas, ela não seria necessária para contrariar as manobras de sua mãe.

Mas, ao voltar à sala, depois da carta acabada, ela viu, com infinita surpresa, razão para temer que sua mãe tivesse sido astuciosa de mais para ela.


Ao abrir a porta, deparou com a sua irmã e Bingley perto um do outro e de pé, junto da lareira, como se conversassem sobre assunto de extrema gravidade. E, se tal facto não bastasse para despertar suspeitas, a expressão de ambos, ao voltarem-se subitamente e afastarem-se um do outro, revelaria tudo. A situação deles era bastante embaraçosa, mas a sua própria, pensou Elizabeth, era pior ainda. Nenhum deles pronunciou uma palavra, e Elizabeth preparava-se para sair novamente quando Bingley, que, imitando o exemplo de Jane, se tinha sentado, subitamente se levantou e, sussurrando algumas palavras ao ouvido de Jane, saiu apressadamente da sala.

Jane não tinha reservas para com Elizabeth quando o assunto da confidência era ocasião para regozijo; e, abraçando a irmã, imediatamente lhe confessou, com viva emoção, que ela era a criatura mais feliz do mundo.

- É demasiado para mim - acrescentou ela. - Não mereço tanto. Por que razão não hão-de ser todos tão felizes como eu?

Elizabeth deu-lhe os parabéns com uma sinceridade, um calor e um entusiasmo que as palavras não podiam exprimir. Cada uma das suas palavras era uma nova fonte de felicidade para Jane.

Mas esta não poderia demorar-se mais junto da irmã, nem tinha tempo para lhe dizer metade do que ainda lhe restava para contar.


- Preciso de ir neste instante ver a mãe - exclamou ela. - Não quero deixá-la por mais tempo em suspenso, depois de toda a sua carinhosa solicitude. Nem quero que ela saiba de tudo senão por meu intermédio. Ele já foi falar com o pai. Oh, Lizzy, que contentes que todos eles vão ficar, com o que eu tenho para lhes dizer! Como poderei suportar tamanha felicidade!

Jane correu, então, ao encontro de sua mãe, que propositadamente interrompera o jogo das cartas e se encontrava em cima com Kitty.


Elizabeth, que ficara sozinha, sorriu da rapidez e da facilidade com que se tinha resolvido o assunto, que durante tantos meses lhes causara ansiedade e incerteza.

«E este», disse ela para consigo mesma, «é o fim de todos os cuidados e precauções do amigo e das mentiras e ardis da irmã; o fim mais feliz, mais justo e mais razoável!»

Poucos minutos depois, Bingley, cuja entrevista com o Sr. Bennet fora curta e decisiva, veio juntar-se a ela.

- Onde está a sua irmã? - Perguntou ele ansiosamente, ao abrir a porta.

- Lá em cima, com a minha mãe. Ela vem já.

Bingley então fechou a porta e, aproximando-se, reclamou-lhe os seus parabéns e a sua afeição de irmã. Elizabeth, sincera e cordialmente, exprimiu-lhe toda a sua alegria, e apertaram-se as mãos. Em seguida, até sua irmã voltar, ela teve de ouvir tudo o que ele dizia sobre a sua própria felicidade e as perfeições de Jane; e, apesar de serem aquelas as expressões de uma pessoa apaixonada, Elizabeth acreditava realmente no bom fundamento das suas esperanças, pois elas tinham como base a excelente compreensão e o génio incomparável de Jane e uma similaridade geral de sentimentos e gostos entre ambos.

Aquela foi uma noite de grande alegria para todos. A felicidade de Jane dava ao seu rosto um brilho e uma doçura que o tornava mais belo do que nunca. Kitty soltava risinhos e sorria, na esperança de que em breve chegaria a sua vez. A Sr.a Bennet não encontrava termos suficientemente calorosos para exprimir o seu consentimento e a sua aprovação, pelo que se referiu ao acontecimento durante apenas meia hora. E, quando o Sr. Bennet apareceu, à hora da ceia, a sua voz e os seus modos mostravam claramente o contentamento que o possuía.

Porém, não aludiu uma só vez ao facto, enquanto o conviva esteve presente; mas, assim que ele partiu, o Sr. Bennet voltou-se para a filha e disse-lhe:

- Jane, dou-te os meus parabéns. Serás uma mulher muito feliz.

Jane correu para ele, beijou-o e agradeceu-lhe a sua bondade.

- És uma boa pequena - disse ele - e tenho enorme prazer em ver-te bem casada. Não duvido de que se hão-de dar muito bem um com o outro. Os vossos temperamentos são bastante semelhantes. Ambos são tão tolerantes que nunca tomarão resoluções definitivas; tão fáceis de levar que todos os criados vos enganarão; e tão generosos que hão-de sempre gastar mais do que têm.

- Espero bem que não. Imprudência ou imprevidência em matéria de dinheiro seriam imperdoáveis da minha parte.

- Gastar mais do que têm! Meu caro Sr. Bennet - exclamou a sua mulher -, que está o senhor a dizer? Ora, ele tem quatro ou cinco mil libras anuais, ou talvez mais ainda. - E, em seguida, voltando-se para a filha: - Oh, minha querida e adorada Jane, sinto-me tão feliz que estou certa de não conseguir pregar olho esta noite! Eu sabia que isto haveria de acontecer. Eu sempre disse que tudo acabaria em bem. Tinha a certeza de que a tua beleza acabaria por triunfar! Lembro-me perfeitamente que, quando no ano passado ele aqui chegou e eu o vi, imediatamente disse para comigo que vocês tinham nascido um para o outro. Oh! Ele é a criatura mais simpática que jamais se viu.

Wickham, Lydia e tudo o mais ficou esquecido. Jane era, de longe, a sua filha favorita. Naquele instante, ela não pensava em nenhuma outra. As suas irmãs mais novas começaram logo a imaginar os proveitos e prazeres susceptíveis de lhes serem proporcionados com o casamento dela.

Mary pediu para usar a biblioteca de Netherfield; e Kitty insistia para que ela desse vários bailes todos os Invernos.

A partir daí, naturalmente, Bingley passou a vir todos os dias a Longbourn; chegando quase sempre antes do pequeno-almoço e nunca partindo senão depois do jantar, excepto quando algum cruel vizinho o convidava para sua casa, o que ele não tinha coragem para recusar.

Elizabeth dispunha agora de muito pouco tempo para conversar com a irmã, pois, enquanto Bingley estava presente, Jane não podia dar atenção a mais ninguém; contudo, viu-se de considerável utilidade para ambos, durante aquelas pequenas separações que necessariamente ocorrem por vezes. Na ausência de Jane, ele procurava a companhia de Elizabeth, pelo prazer de conversar com ela; e, depois de Bingley partir, Jane procurava constantemente idêntico consolo.

- Ele deu-me uma grande felicidade - disse Jane, certa noite - ao dizer-me que ignorara totalmente que eu tivesse estado em Londres na Primavera passada. Não acreditava que isso fosse possível.

- Eu já suspeitava disso - replicou Elizabeth. - Mas como é que ele te explicou o facto?

- Deve ter sido por culpa das irmãs. Naturalmente, elas não viam com bons olhos as suas relações comigo, coisa, aliás, que eu acho aceitável, pois ele poderia ter feito uma escolha muito mais vantajosa sob todos as aspectos. Mas, quando elas virem a felicidade do irmão comigo, espero que se resignem e me aceitem, embora nunca mais possamos ter a mesma intimidade de antes.

- Essas tuas palavras - exclamou Elizabeth - são as mais severas que eu jamais te ouvi pronunciar. Minha valente! Custar-me-ia bastante, de facto, ver-te de novo iludida pela falsa amizade da Menina Bingley.

- Imagina, Lizzy, que quando ele foi para Londres, em Novembro, já gostava de mim; e só não voltou porque o convenceram de que eu lhe era totalmente indiferente.

- Ele cometeu um pequeno erro, decerto; mas isso só prova a sua modéstia.

Isto conduziu Jane, naturalmente, a fazer um panegírico da discrição de Bingley e do pouco valor que ele atribuía às suas boas qualidades.

Elizabeth ficou satisfeita por descobrir que ele não tinha revelado a interferência do amigo, pois, embora Jane tivesse o coração mais generoso do mundo, tal atitude seria considerada por ela imperdoável.

- Sou decerto a criatura mais feliz que jamais existiu - exclamou Jane. - Oh! Lizzy, porque, entre todas, fui eu a escolhida para receber tão grande graça! Se ao menos te pudesse ver tão feliz como eu! Se existisse outro homem igual para ti!

- Mesmo que me arranjassem quarenta desses homens, nunca seria tão feliz como tu. Para ter a tua felicidade, teria de ter também o teu temperamento e a tua bondade. Não, não, deixa-me entregue ao meu próprio destino; e quem sabe se, com um pouco de sorte, não me aparecerá um dia um outro Sr. Collins pela frente.

A nova situação na família de Longbourn não poderia permanecer por muito mais tempo em segredo. A Sr.a Bennet teve o privilégio de sussurrar a novidade ao ouvido da Sr.a Philips, e esta ousou, sem autorização, fazer o mesmo a todas as suas vizinhas em Meryton.

Os Bennet em breve foram considerados por todos como a família mais afortunada do mundo, embora poucas semanas antes, quando Lydia fugira, tivessem sido apontados como pessoas marcadas pelo infortúnio.


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