quinta-feira, 17 de maio de 2012

Capítulo 43 - Elizabeth conhece Georgiana


Capítulo 43 - Elizabeth conhece Georgiana


Elizabeth combinara com o Sr. Darcy trazer-lhe a irmã a visitá-la logo no dia seguinte ao da sua chegada a Pemberley e decidiu não se afastar da hospedaria durante essa manhã. Porém, a sua conclusão foi falsa, pois logo na manhã seguinte ao da sua chegada a Lambton, surgiram esses visitantes. Elizabeth e seus tios tinham andado passeando pela cidade com alguns dos seus novos amigos e acabavam de regressar à hospedaria, a fim de se vestirem para jantar com a mesma família, quando o ruído de uma carruagem os atraiu a uma janela. Elizabeth imediatamente reconheceu a libré e, compreendendo o que se tratava, participou, com grande surpresa dos seus parentes, a honra que estava esperando. Os seus tios ficaram estupefactos; e, tanto o embaraço de Elizabeth ao comunicar-lhes tal acontecimento como a circunstância em si, acrescida ainda à lembrança das muitas outras coisas do dia precedente, lhes deu uma nova visão do que realmente se passava. Nada o havia sugerido anteriormente, mas sentiam agora não haver outra maneira de explicar as atenções do Sr. Darcy sem supor um interesse dele pela sua sobrinha. Enquanto essas novas ideias lhes atravessavam o pensamento, a perturbação de Elizabeth crescia a cada momento. Ela mesma se surpreendeu com o seu nervosismo. Além de outras inquietações, ela temia que o Sr. Darcy, com a sua parcialidade, houvesse exagerado na apologia da sua pessoa; e, ansiosa como nunca por agradar, desconfiava naturalmente de que todos os seus recursos seriam escassos.

Elizabeth afastou-se da janela, receando ser vista; e, enquanto caminhava de um lado para o outro, procurando acalmar-se, reparou nos olhares curiosos dos seus tios, o que dificultou tudo muito mais.

O Sr. Darcy e a irmã apareceram, e aquela temível apresentação teve lugar. Com espanto, Elizabeth percebeu que a sua nova conhecida estava tanto ou mais embaraçada do que ela. Desde que se encontrava em Lambton, Elizabeth ouvira várias vezes dizer que a Menina Darcy era extremamente orgulhosa; mas aquele exame de alguns minutos bastou-lhe para constatar que ela era apenas excessivamente tímida. Foi muito difícil arrancar dela outras palavras que não fossem simples monossílabos.

A menina era alta e mais corpulenta do que Elizabeth, e, embora contasse pouco mais de dezesseis anos, as suas formas eram bem desenvolvidas e a sua aparência graciosa. Os seus traços eram menos regulares e belos do que os do irmão, mas transparecia neles o bom senso e a cordialidade, e os seus modos perfeitamente simples e delicados. Elizabeth, que receava encontrar nela uma observadora tão perspicaz e implacável como o Sr. Darcy se mostrara, sentiu-se extremamente aliviada ao discernir tamanha diferença de feitio.

Poucos momentos depois de chegar, o Sr. Darcy participou que Bingley também lhe viria apresentar os seus cumprimentos, e Elizabeth mal tivera tempo de exprimir a sua satisfação quando ouviu na escada os passos rápidos de Bingley, e, no mesmo instante, ele surgiu na sala. Há muito que se tinha acalmado todo o ressentimento de Elizabeth contra ele; e, mesmo que conservasse ainda um resto daqueles sentimentos, ter-lhe-ia sido impossível resistir à singela cordialidade com que ele se exprimiu ao tornar a vê-la. Ele perguntou-lhe delicadamente pela sua família, embora de um modo vago, falando-lhe com a mesma tranquilidade bem humorada de sempre.

O Sr. e a Sr.a Gardiner olharam-no também com muito interesse. Há muito que desejavam conhecê-lo. O grupo todo, aliás, despertava neles a mais viva curiosidade. As suspeitas que neles brotaram com respeito ao Sr. Darcy e à sobrinha fizeram que eles os observassem atenta mas reservadamente; e imediatamente chegaram à conclusão de que um deles, pelo menos, sabia o que era o amor. Quanto aos sentimentos de Elizabeth, ficaram um pouco na dúvida; mas era evidente que o jovem tinha por ela uma fervorosa admiração.

Elizabeth, pelo seu lado, tinha muito que fazer. Queria certificar-se dos sentimentos de cada um dos visitantes, dominar os seus e tornar-se agradável para todos; e neste último ponto, acerca do qual eram maiores as suas apreensões, ela podia estar certa do seu êxito, pois aqueles a quem ela desejava agradar estavam predispostos em seu favor. Em Bingley encontrou ela a melhor das disposições, Georgiana ansiava por satisfazê-la e Darcy estava sequioso das suas atenções.

Perante Bingley, Elizabeth lembrou-se naturalmente de sua irmã; e naquele momento ela teria dado tudo para saber se os pensamentos dele tinham tomado o mesmo rumo que os seus. Por vezes ela tinha a sensação de que ele falava menos do que o costume; e outras vezes parecia-lhe que, ao olhar para ela, ele procurava encontrar no seu rosto a semelhança de outra pessoa. Mas, embora tudo isto não passasse de pura imaginação, Elizabeth não se iludia quanto ao comportamento dele para com a Menina Darcy, na qual certas pessoas tinham esperado encontrar uma rival de Jane. Nem de um lado nem de outro, um só olhar deixou transparecer qualquer interesse especial. Nada se passou entre eles que pudesse justificar as perspectivas da Menina Bingley. Neste ponto ela em breve se satisfez; e, antes de partirem, um ou dois pequenos factos ocorreram que, segundo a interpretação ansiosa de Elizabeth, denotavam uma recordação de Jane, não destituída de ternura, e um desejo de dizer algo mais que poderia conduzir à menção do seu nome, tivesse ele ousado. O Sr. Bingley observou-lhe, numa dada altura, em que os outros se encontravam conversando, e num tom que denotava uma certa mágoa, que «há muito tempo que ele não tinha o prazer de vê-la»; e, antes que ela pudesse responder-lhe, acrescentou: «Há mais de oito meses. Não nos vemos desde o dia 26 de Novembro, quando nos encontrávamos todos dançando em Netherfield.»

Elizabeth ficou satisfeita pela precisão da sua memória; e, numa outra altura, ele logrou, sem ser ouvido pelos outros, perguntar-lhe se «todas» as suas irmãs se encontravam em Longbourn. A pergunta nada tinha de excepcional, assim como a observação precedente, mas eram o seu olhar e modos que lhe emprestavam todo o significado.

Elizabeth não teve muitas ocasiões de voltar os olhos para o Sr. Darcy, mas, de todas as vezes que o olhava de relance, surpreendia nele uma expressão de contentamento, e tudo o que ele dizia era num tom tão diferente da sua antiga altivez e desdém que Elizabeth se convenceu de que a melhoria nos seus modos que ela presenciara na véspera, por mais temporária que fosse, demorava pelo menos mais de um dia. Quando ela o via assim ocupado em procurar a companhia e a boa opinião de pessoas com as quais ainda há tão poucos dias ele teria julgado desonroso manter relações, quando o ouvia tratar com a maior amabilidade não só a ela, Elizabeth, mas aos seus próprios parentes, que ele tão abertamente desdenhara durante aquela cena no presbitério de Hunsford, a mudança parecia tão radical e impressionava-a a tal ponto que só com o maior esforço ela conseguia esconder a sua surpresa. Nunca o vira tão desejoso de agradar, tão livre de orgulhosas e rígidas reservas como agora, nem mesmo quando na companhia dos seus queridos amigos de Netherfield, ou no meio dos seus importantes parentes em Rosings.

Os visitantes permaneceram com eles mais de meia hora; e quando se levantaram para partir, o Sr. Darcy dirigiu-se à irmã, pedindo-lhe que o secundasse no convite que ele fazia aos Srs. Gardiner e a Elizabeth para um jantar em Pemberley antes da sua partida. A Menina Darcy prontamente acedeu ao seu pedido, embora com uma timidez que revelava o pouco hábito em fazer convites. A Sr.a Gardiner olhou para a sobrinha, desejosa de saber se Elizabeth, a quem o convite principalmente se destinava, estava disposta a aceitá-lo, mas ela voltara a cara. Presumindo, porém, que tal atitude exprimia mais um momentâneo embaraço do que qualquer desagrado na proposta, e percebendo que o seu marido, que apreciava a sociedade, estava disposto a aceitar, ela deu o seu consentimento, e o jantar foi marcado para daí a dois dias.

Bingley exprimiu então todo o seu prazer em tornar a ver Elizabeth, pois tinha ainda muito que lhe dizer e perguntas a fazer sobre os seus amigos do Hertfordshire. Elizabeth, notando nisso o seu desejo de ouvir falar em Jane, ficou satisfeita; e, graças a isso, assim como a outras coisas, depois de os visitantes partirem, ela pôs-se a pensar naquela última meia hora com alguma satisfação, embora durante todo o decurso da visita tivesse sido pequeno o seu prazer. Ansiosa por ficar a sós e temendo as perguntas e alusões dos seus tios, permaneceu na companhia destes apenas o tempo necessário para ouvir às suas opiniões favoráveis sobre Bingley, depois do que os deixou precipitadamente, pretextando ter de se vestir.

Porém, ela não tinha razão em temer a curiosidade do Sr. e da Sr.a Gardiner, pois não desejavam forçar as suas confidências. Tornara-se-lhes evidente que Elizabeth conhecia o Sr. Darcy muito mais intimamente do que eles tinham suposto; e percebiam que ele estava muito apaixonado por ela. Sentiam por tudo aquilo um grande interesse, porém nada que justificasse indagações.

Quanto ao Sr. Darcy, ansiavam por imaginar as melhores coisas a seu respeito, e, tanto quanto o conheciam, não encontravam nele qualquer defeito. Não podiam deixar de se sentir impressionados pela sua delicadeza; e, se fossem ajuizar o seu carácter pelas suas próprias impressões e pelas informações da governanta, sem qualquer referência a outro respeito, o circulo de pessoas do Hertfordshire no qual ele era conhecido não o teria reconhecido como sendo o do Sr. Darcy. Viam agora um certo interesse em acreditar nas palavras da governanta; e em breve concluíram que a opinião de uma criada, que o conhecera desde os quatro anos de idade e cuja aparência era a de uma pessoa digna e respeitável, não poderia ser sumariamente rejeitada. Os seus amigos de Lambton, por outro lado, nada sabiam que pudesse diminuir o valor daquele testemunho. De nada o acusavam, a não ser do seu orgulho. E orgulho, ele tinha-o, certamente; e, mesmo que não o tivesse, esse defeito ser-lhe-ia de qualquer modo imputado pelos habitantes de uma pequena cidade provinciana, onde a família não possuía relações. Todos eram unânimes, no entanto, em ver nele um homem generoso e pródigo para com os pobres.

Quanto a Wickham, os visitantes logo descobriram que ele não era muito estimado no lugar, e, embora nada de preciso se soubesse sobre as suas relações com o filho do seu protector, era, no entanto, sabido que ao sair do Derbyshire deixara muitas dividas, que acabaram por ser saldadas pelo Sr. Darcy.

Elizabeth pensou mais em Pemberley naquela noite do que na precedente; e, embora as horas lhe parecessem difíceis de passar, não foram suficientes para chegar a uma conclusão acerca dos seus sentimentos; e ficou duas horas acordada, tentando ler no seu coração. Certamente não o odiava. Não, o ódio há muito que se dissipara e há muito também que se envergonhava de ter alguma vez antipatizado com ele. O respeito que as suas valiosas qualidades lhe inspiravam, embora a principio admitido com relutância, já há bastante tempo que deixara de repugnar aos seus sentimentos; e tinha-se agora transformado num sentimento mais cordial, graças aos testemunhos tão altamente em seu favor e à impressão favorável que Darcy lhe produzira na véspera. Mas, acima de tudo, para além do respeito e da estima, encontrava em si mesma um motivo de boa vontade que não poderia ignorar: era a gratidão. Gratidão não só porque ele a amara, mas porque ele ainda a amava o bastante para esquecer toda a acrimónia e petulância com que ela o rejeitara e todas as acusações injustas com que fizera acompanhar essa rejeição. Ela chegara a persuadir-se de que Darcy, de futuro, a evitaria como a pior inimiga; e, no entanto, durante aquele encontro acidental, ele mostrara-se ansioso por reatar relações; e, sem exibir qualquer indelicadeza de sentimentos ou excentricidade de maneiras, que sugerisse aquilo que lhes dizia respeito apenas a eles dois, ele procurava angariar a boa opinião dos amigos dela e insistira para apresentá-la a sua irmã. Uma tal mudança num homem tão orgulhoso suscitava não só o espanto, como a gratidão - pois só ao amor, e a um amor ardente, é que ela poderia ser atribuída; e a impressão que sobre ela esse amor produzia não era de modo algum desagradável, embora não pudesse ser exactamente definido. Ela respeitava-o, estimava-o, era-lhe grata e sentia um interesse real pelo seu bem-estar; e quereria apenas saber até que ponto ela desejava que aquele bem-estar dependesse dela e, para a felicidade de ambos, até que ponto ela deveria empregar o poder que imaginava ainda possuir em fazer que ele renovasse as suas atenções.

Ficara decidido naquela noite, entre tia e sobrinha, que uma delicadeza tão decisiva como aquela manifestada pela Menina Darcy, em vir visitá-las no dia da sua própria chegada a Pemberley, deveria ser retribuída por um esforço de cortesia da sua parte; e decidiram pela conveniência de uma visita a Pemberley na manhã seguinte. A Elizabeth agradou-lhe a ideia, e, embora perguntasse a si própria o motivo desse contentamento, não encontrou resposta.

O Sr. Gardiner deixou-as logo após o pequeno-almoço. O convite para pescar fora renovado no dia anterior e um encontro fora marcado com alguns dos cavalheiros em Pemberley, ao meio-dia.

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