Capítulo 60 - Elizabeth e Darcy casados
Feliz para os seus sentimentos maternais foi o dia em que a Sr.a Bennet se viu livre de duas das suas filhas mais queridas. É fácil imaginar com que orgulho ela visitava, mais tarde, a Sr.a Bingley e falava da Sr.a Darcy. Desejaria poder acrescentar, em atenção pela sua família, que a realização do seu mais elevado desejo em ver casadas grande parte das suas filhas tivera o feliz efeito de a tornar numa mulher sensata, discreta e interessante para o resto da sua vida. Contudo, afortunadamente para o marido, que talvez não tivesse apreciado uma felicidade doméstica tão excepcional, ela continuou ocasionalmente nervosa e invariavelmente tola.
O Sr. Bennet
sentiu grandemente a falta da sua segunda filha. A sua afeição por ela foi um
dos motivos por que, daí por diante, mais o obrigaram a sair de casa. Adorava
ir a Pemberley, sobretudo quando não era esperado. O Sr. Bingley e Jane ficaram
em Netherfield apenas mais um ano. Tamanha proximidade da Sr.a Bennet e dos
conhecidos de Meryton não era desejável, mesmo levando em conta o temperamento
brando de Bingley e o coração afectuoso de Jane. O grande desejo das irmãs de
Bingley foi finalmente satisfeito, e ele comprou uma propriedade nas
proximidades do Derbyshire; e, em acréscimo a todas as suas outras felicidades,
Jane e Elizabeth residiam agora a trinta milhas uma da outra.
Kitty passava a
maior parte do tempo com as duas irmãs mais velhas, o que constituiu verdadeira
vantagem para ela. Numa sociedade tão superior à que ela conhecera, em breve
fez grandes progressos. Kitty não tinha o génio rebelde de Lydia, e, longe da
influencia e do exemplo da irmã e graças a certos cuidados e atenções, ela
tornou-se menos irritável, menos ignorante e menos insípida. Ela era
cuidadosamente preservada de qualquer nova influência da parte de Lydia, e,
embora a Sr.a Wickham frequentemente a convidasse a ir passar alguns tempos a
sua casa, com promessas de bailes e rapazes, o seu pai jamais consentia que ela
fosse.
Mary era a única
que permanecia em casa; e, como a Sr.a Bennet não suportasse a solidão, ela
viu-se necessariamente impedida de prosseguir no aperfeiçoamento dos seus
talentos. Obrigada a frequentar mais assiduamente a sociedade, continuou, no
entanto, a tirar conclusões morais de cada visita que fazia; e, como Mary já
não sentisse a mortificação da comparação da beleza das suas irmãs com a dela
própria, seu pai desconfiou que ela aceitava sem muita relutância essa
alteração dos seus hábitos.
Quanto a Wickham
e Lydia, o casamento pouco os modificou. Wickham resignou-se filosoficamente à
convicção de que Elizabeth estava agora a par de todas as suas ingratidões e
mentiras; mas, apesar disso, continuava a alimentar a esperança de que ela um
dia pudesse convencer Darcy a fazer a sua fortuna. A carta que Elizabeth
recebeu de Lydia por ocasião do seu casamento revelou-lhe que tal esperança era
acalentada pela mulher, senão pelo próprio marido. A carta dizia o seguinte:
Minha querida
Lizzy,
Desejo-te grande
felicidade. Se o teu amor pelo Sr. Darcy é apenas metade do que eu sinto pelo
meu marido Wickham, então és decerto muito feliz. E um consolo saber-te tão
rica, e, quando não tiveres nada para fazer, espero que te lembres de nós.
Wickham gostaria muito de enveredar pela carreira jurídica, mas não creio que
tenhamos dinheiro suficiente para vivermos sem auxílio. Qualquer lugar de
trezentas ou quatrocentas libras por ano serviria; mas, se preferes, não
menciones o assunto ao Sr. Darcy. A tua, etc.
Como Elizabeth
preferiu não mencionar o assunto, procurou, na sua resposta, pôr termo a todos
os pedidos dessa natureza. No entanto, ela passou a enviar-lhe tudo o que
economizava das suas despesas particulares. Sempre lhe parecera evidente que a
renda de que eles gozavam, dirigida por pessoas tão extravagantes nos seus
desejos e imprevidentes quanto ao futuro, seria insuficiente para o seu
sustento; e, sempre que o casal mudava de residência, Jane e Elizabeth podiam
estar certas de receber um pedido de auxílio, pois havia sempre contas por
pagar. A sua maneira de viver, mesmo quando tinham uma casa, era sempre muito
irregular. Estavam constantemente em mudança, de localidade para localidade, em
busca de uma situação barata, e gastavam sempre mais do que possuíam. A afeição
de Wickham por Lydia em breve se transformou em indiferença. A de Lydia resistiu
por mais algum tempo. Apesar da sua mocidade e das suas maneiras, ela conservou
intacta a reputação que o casamento lhe havia assegurado.
Embora Darcy não
admitisse a ideia de receber Wickham em Pemberley, contudo, em atenção por
Elizabeth, ajudou-o na sua carreira. Lydia visitava-os ocasionalmente, quando o
seu marido ia a Londres ou a Bath, para se divertir. Em casa dos Bingley, no
entanto, eles demoravam-se mais tempo, a ponto de esgotar toda a paciência e
bom humor de Bingley, que chegou a falar em dar-lhes a entender que os
desejaria ver da sua casa para fora.
A Menina Bingley
ficou profundamente mortificada com o casamento do Sr. Darcy; mas, como achou
aconselhável conservar o direito de frequentar Pemberley, sufocou todo o seu
ressentimento. Continuou a gostar de Georgiana, mostrou-se quase tão atenciosa
para com Darcy como antigamente e pagou com juros todas as cortesias que devia
a Elizabeth.
Georgiana foi
residir para Pemberley. A afeição entre as duas novas irmãs correspondeu a
todas as expectativas de Darcy, e até mesmo às intenções das duas raparigas.
Georgiana tinha uma grande admiração por Elizabeth. A princípio, fora com
assombro e um pouco de horror que ouvira os gracejos e brincadeiras de
Elizabeth para com o marido. O irmão sempre lhe inspirara um respeito que quase
sufocava a sua afeição. Começou, então, a saber coisas que ignorava: e
Elizabeth explicou-lhe que uma esposa pode-se permitir com o marido liberdades
que um irmão nem sempre poderia tolerar na irmã dez anos mais jovem do que ele.
Lady Catherine
ficou extremamente indignada com o casamento do sobrinho; e, dando largas à
franqueza que a caracterizava, ela enviou uma resposta em termos tão violentos,
especialmente contra Elizabeth, à carta de participação do sobrinho que durante
algum tempo as relações mantiveram-se totalmente cortadas. Por fim, contudo,
Elizabeth conseguiu o perdão do marido para a ofensa e fez que ele procurasse a
reconciliação. Após alguma resistência, o ressentimento de Lady Catherine
cedeu, quer pela afeição que tinha pelo sobrinho, quer pela sua curiosidade em
ver como a sua esposa se conduzia; e consentiu em ir visitá-los a Pemberley,
apesar da afronta aos seus ilustres antepassados, não só pela presença de uma
esposa de tão baixa extracção, como pelas visitas constantes dos seus tios de
Londres.
Com os Gardiner,
eles mantiveram sempre grande intimidade. Darcy, a exemplo de Elizabeth, tinha
a maior afeição por eles, pois, além de tudo o mais, nunca se esqueceram da
gratidão que deviam às pessoas por cujo intermédio eles tinham reatado as suas
relações, durante aquele passeio pelo Derbyshire.